Santiago de Mil Amores
Onde a vida sabe a chile
Por Geraldo Gabliel
EVILEUZA ALVES
San Isidro 80,
SANTIAGO – CHILE
(Latitude:-33.44433210 |
Longitude:-70.64429000)
Sabor picante, o chile, muito apreciado pelos latinos, também tempera a vida chilena de forma marcante, não apenas nos petiscos do prato, mas a própria vida e Bamboleo¹ daquela gente – o que conquistou o coração e alma de Evy. Saudades dela, vivia aqui na Capital do Café. Que o digam os indígenas Suruís: enfermeira dedicada, carinhosa – o dom da benevolência em pessoa!
E, é de lá, do Chile*, que Evileuza escreve ao seu amigo Geh Latinus, contando algumas curiosidades e estranhezas culturais vivenciadas na Capital Santiago – que lhes conto aqui em nossas palavras latinas:
Chile: Entre Tremores, Costumes e um Espanhol Bem Peculiar
Evileuza, tão bela quanto a lua cheia iluminando a noite chilena, passeia pelas ruas de Santiago como quem domina a paisagem. Traquina, de sorriso maroto, atrai olhares e encanta aqueles que visitam seu Taller de Beleza. “A lua é nossa”, dizem os chilenos, “nós a compramos”². E, com essa certeza quase poética, seguem construindo um país de contrastes.
Se você visitar Evileuza, prepare-se para surpresas. “Sabem sobre aquele deserto florido?” ela pergunta com um brilho nos olhos. “Aqui temos uma lei que proíbe a dança no Deserto do Atacama. Se você se casar entre as flores do deserto, terá de ser sem Cueca…”. Afinal, a Cueca não é o que muitos imaginam, mas sim uma dança típica chilena que representa um galo cortejando uma galinha. Estranho? Talvez. Mas tudo no Chile tem um charme particular.
E, claro, Evileuza não deixaria você sair de sua cidade sem um convite especial: “Quando você vir me visitar, eu lhe convido para la Once (11). Não se atrase, espero por você, pontualmente, à noitinha.” E antes que você pense que esse encontro será às 11 da manhã ou da noite, saiba que la Once é um chá da tarde que pode acontecer às 18h ou 19h – um mistério até para os mais acostumados à cultura chilena.
Imagine caminhar pelas ruas de Santiago em um dia quente de verão. O sol castiga, a brisa é escassa, e a vontade de arrancar a camisa é irresistível. Mas cuidado! No Chile, essa prática é proibida em locais públicos. A liberdade de sentir o vento na pele é limitada a áreas específicas, como praias e clubes privados. Para os mais desprevenidos, a multa pode ser um lembrete nada agradável desse costume enraizado.
E se a sede apertar depois de um longo passeio, é bom pensar duas vezes antes de abrir uma garrafa de vinho ou uma cerveja em um parque. A lei chilena proíbe o consumo de bebidas alcoólicas em espaços públicos. Por outro lado, dentro de bares e restaurantes, o país celebra a cultura do vinho, oferecendo rótulos de qualidade e preços acessíveis. A hipocrisia da regra, para muitos, é um reflexo da tentativa do governo de manter uma ordem que nem sempre condiz com a realidade.
Mas há algo ainda mais curioso: no Deserto do Atacama, algumas áreas possuem leis municipais que proíbem a dança em festas, restaurantes e bares. O motivo exato? Quase um mistério, mas especula-se que a tranquilidade da região e o respeito ao ambiente sejam fatores predominantes. Uma ironia, considerando que o Chile é também um país de grandes festivais e celebrações regadas a música e ritmo.
Se a cultura chilena já parece peculiar, seus costumes reforçam essa sensação. Um dos mais inusitados é o famoso “Café con piernas”, estabelecimentos onde as garçonetes usam saias curtas e servem café para clientes que, em sua maioria, são senhores de idade. Algumas versões desses cafés são abertas, enquanto outras possuem vidros escuros e parecem algo além de uma simples cafeteria.
Além dos cafés peculiares, há práticas como a propina, que não significa corrupção, mas sim gorjeta. No Chile, é comum dar pelo menos 10% ao garçom e até mesmo aos empacotadores de supermercado, que dependem exclusivamente dessas contribuições para sua renda.
Até no supermercado há surpresas. Embalagens de alimentos destacam advertências sobre excesso de açúcar, sal ou gordura, fazendo com que o consumidor pense duas vezes antes de levar aquele chocolatinho para casa.
Ir à praia também é uma experiência diferente. O clima frio muitas vezes não convida para um mergulho, mas os chilenos encaram as águas geladas como algo natural. O público se veste de formas diversas – de biquínis enormes a casacos e botas, sem a pressão estética comum em outros países. Além disso, é completamente normal ver cachorros passeando tranquilamente pela areia.
Mas talvez a maior surpresa para quem chega ao Chile seja a forma como o espanhol é falado. O chilensis, ou carinhosamente chilenês, pode deixar qualquer estrangeiro confuso. O chileno fala rápido, encurta palavras e usa expressões únicas. Se você aprendeu a dizer “¡Hola! ¿Cómo estás?”, provavelmente vai ouvir algo diferente como “¡Hola! ¿Cómo estai?”. Aqui, “weón” pode significar desde um insulto até um jeito carinhoso de chamar um amigo. “Fome” não tem nada a ver com comida, mas com algo chato. E “cachai?” é a versão chilena de “entendeu?”. Outra expressão comum por lá é “Qué lata” que se usa para expressar enfado ou chateação. É uma forma coloquial de expressar a moléstia e o descontentamento em situações inusitadas.
No fim das contas, o Chile é um mosaico de peculiaridades, misturando regras rigorosas, perigos subjetivos, hábitos inesperados e um espanhol que pode desafiar até os mais fluentes na língua. Em meio às leis rígidas e à terra inquieta, o povo chileno encontrou sua própria maneira de viverc – com uma mistura de tradição, adaptação e um toque de excentricidade.
Encerro por aqui, ouvindo “Besame mucho… como se fuera esta noche la última vez” (https://www.letras.mus.br/cesaria-evora/986159/#radio:gipsy-kings).
Até breve…
¹https://www.letras.mus.br/gipsy-kings/133075/ Acesso em 24 de maio de 2025.
²https://telescopioschile.cl/el-chileno-dueno-de-la-luna-2/ Acesso em 24 de maio de 2025.
* A palavra “chile” em espanhol pode ter vários significados, incluindo:
Chile como um substantivo que se refere ao país ou a algo que é forte ou intenso.
Chile também pode significar “pimenta” ou “pimento”.
Em gírias, “chile” é usado para se referir a “pênis”.